O curso de psicanálise entrou em
minha vida da mesma forma que todos os outros projetos de estudo, carreira ou
simplesmente hobbies que iniciei: motivada por uma busca incessante de
significado e propósito prá vida. De pertencimento e também reconhecimento.
Ainda que até então eu não soubesse, ou não admitisse ser esse o combustível de
minha inconstância (muitas vezes sem lógica e sem explicação para mim mesma)
ela sempre foi traduzida numa busca desenfreada por novos conhecimentos,
leituras, novos cenários, pessoas e “tribos”. Novas e efêmeras emoções de
prazer, de sentir-se bem, sentir-se reconhecida, protagonista. Uma nova persona
a cada novo projeto, a cada nova experiência. Ouso dizer que começo a entender,
ou pelo menos tentar entender, essa inconstância como sintoma, como sinal do
que falta, mas também do que tenho em excesso. Sem mencionar as infinitas
possibilidades de descobertas vindouras de um mar de pensamentos, sentimentos,
desejos e o que mais a mente humana é capaz de produzir e armazenar, de forma
consciente e inconsciente, o caminho que estou percorrendo através da
psicanálise tem se mostrado não somente fascinante como também aterrorizante.
Sim: terror. Medo. Angústia. Raiva.
Beleza. Compaixão. Empatia. Amor. Carinho. Pertencimento. Ressignificados.
Reencontros. Despedidas. Como não acessar tais sensações quando iniciada de
forma tão nua e crua a jornada através dos mecanismos de funcionamento daquilo
que mais me encanta e ao mesmo tempo mais me assusta: minha própria mente e tudo
que ela é capaz de ser, sentir, esconder, silenciar, gritar, compreender,
enaltecer, retroceder, adoecer, transparecer, criar, amar, odiar, pulsar,
apreender, conhecer, vivenciar, desejar.
Confesso que assim como em todas as
outras vezes em que comecei uma nova empreitada, nesta também tinha aquela voz
interna a me dizer: mais uma das tuas, não? Até onde você irá? Quanto tempo
para desistir? E o que irá fazer, dizer, inventar quando mais essa “invencionice”
(neologia necessária e com licença poética) se transformar em mais uma das tuas
ideias mirabolantes, perfeitas, idealizadas e fracassadas por terem sido construídas
no ar e sem fundamento? O Super Ego julgador e perfeitamente conveniente nos
momentos em que meu Ego necessita bater em retirada para as rotas de fuga, já
tentou se sobrepor. Já deu as caras por essa mente que tenta se posicionar de
forma mais clara e verdadeira, sem tanto medo, tanta opressão e autopiedade. Um
verdadeiro embate, digno de horas de insônia, de crises de ansiedade, mecanismos
de defesa e fugas. Mas também de conhecimento, de resiliência, amadurecimento e
sede. Sede de algo mais, de comprometimento, de motivação, de pertencimento.
Sede de mim mesma, da minha essência e do que é essencial e vital.
Id, ego, super ego, eu. Mais alguns
alter egos, algumas personas e toda minha criatividade e necessidade de tecer
narrativas capazes de me manter em uma constante roda viva de possibilidades,
indagações, questionamentos e inquietações. Uma mente inquieta, é o que sou. E
acredito que mentes inquietas assim o são por muito terem sido silenciadas.
Mas a beleza da psicanálise está em
justamente ser voz para todos esses silêncios, todos esses gritos mudos.
Possibilidade em lançar luz e conhecimento àquilo que por muito tempo ficou
sendo sufocado. Uma área de conhecimento em que o próprio conhecimento não é
estático, não é ortodoxo e nem pré-concebido. Apesar de ter bases teóricas
capazes de traçar e demarcar princípios, pilares e fundamentos essenciais para
quem por ela se interessar e quiser ter um norte a seguir, um farol a iluminar
a rota, o caminho a ser percorrido será único, exclusivo, personalizado e com
horizontes com capacidade de expansão infinita e imensurável: tal qual nossa
mente.
O primeiro módulo dessa jornada de
formação em psicanálise foi ao mesmo tempo um soco no estômago e um afago. Um
cair e levantar em espirais de emoções, racionalizações e movimentos de
abertura e introspecção. Levei o triplo do tempo programado (idealizado?) para
concluir, estive em lugares, pensamentos, sombras e escuridão que em outros
tempos, seriam insuportáveis e me levariam a desistir. Mas só por hoje, eu
escolho continuar. E amanhã também. Me comprometendo a vivenciar, aprender e
estudar a psicanálise como uma forma de (re)conhecer quem eu sou de verdade. Ou
pelo menos na medida do que eu for capaz de suportar e entender. Até descobrir
novos limites e possibilidades dessa que com certeza é a mais extraordinária
ferramenta humana: nossa mente. E tudo que ela possa significar.